O Toque de Midas
No décimo-primeiro dia, o rei levou Sileno de volta e entregou-o são e salvo a Dionísio. A alegria do deus ao reencontrar Sileno foi enorme e, para comemorar, ele deu uma festa regada a muito vinho e cantoria. Quando as danças finalmente cessaram, Dioniso disse que desejava agradecer a Midas e propôs satisfazer qualquer desejo do rei, qualquer um. O ambicioso Midas, mesmo já sendo muito rico, pediu que tudo em que tocasse imediatamente se transformasse em ouro. Dionisio consentiu, embora pesaroso por não ter ele feito uma escolha melhor.
Midas seguiu caminho, alegre com o poder recém-adquirido que se apressou a experimentar. Mal acreditou nos próprios olhos quando tocou numa simples mesa de madeira, que se transformou em ouro maciço. Segurou uma pedra; ela mudou-se em ouro. Pegou um torrão de terra; virou ouro. Colheu um fruto da macieira; e parecia até que ele havia furtado do jardim das Hespérides. Maravilhado, Midas ficou frenético. Saiu tocando em tudo o que estava a seu alcançe. Em pouco tempo, tudo quanto era enfeite, móvel, as próprias colunas do prédio, as árvores do jardim... Ouro puro, brilhante, cintilante. De longe dava para ver o palácio de ouro de Midas, faiscando sob os raios do sol.
Sua alegria não conheceu limite e Midas ordenou aos criados que servissem um magnífico banquete para comemorar. Então verificou, horrorizado, que, se tocava o pão, este enrijecia em suas mãos; Carne, frutas suculentas, queijos deliciosos... se levava qualquer comida à boca, seus dentes não conseguiam mastigá-la. Chamou os empregados para ajudá-lo, mas todos se afastavam dele. Quando sua filha chegou ao palácio e, sem saber de nada, o enconstou, também se transformou em ouro, para desespero de Midas.
Então Midas, angustiado de fome e solidão, agora detestava o dom que tanto cobiçara. Começou finalmente a refletir e percebeu que o poder que ele escolheu o condenava a uma morte rápida. Apavorado, ergueu os braços numa prece a Dionísio e, chorando, implora ao deus para que o livrasse daquela destruição fulgurante. Dionísio, divindade benévola, o ouviu e consentiu. "A água corrente desfaz o toque ", disse-lhe Dioniso,"mergulha o que tocastes num rio, e os objetos em que tocaste voltarão a ser o que eram". Midas correu a cumprir o que dissera o deus do vinho e, com a água do rio Pactolo, que colheu num jarro, foi banhando todos os objetos em que tocara, restituindo-lhes a natureza primitiva, a começar pela própria filha, que ele, então, pôde abraçar sem perigo de torná-la de ouro. Dizem que Midas, ao se abaixar para colher a água na margem do rio, tocou na areia com as mãos e que, por isso, até hoje, as águas do rio Pactolo correm sobre areias douradas.
Depois de uma aventura tão desastrosa, Midas devia ter aprendido a ser mais cuidadoso com os deuses, mas não aprendeu e meteu-se em outra enrascada. Depois dos acontecimentos com seu toque de ouro, Midas passou a odiar a riqueza e o esplendor e mudou-se para o campo, onde passou a cultuar Pã, o deus da natureza. Certo dia, Midas ousou afirmar que a flauta tocada por Pã era muito mais melodiosa do que a harpa tocada por Apolo. Quando o deus da música soube disso ficou furioso e castigou aquela afronta fazendo as orelhas de Midas crescerem longas e peludas, como as orelhas de burro. Para ocultá-las, o rei colocou na cabeça um turbante.
Depois de um ano, o cabelo do rei tinha crescido tanto que ele precisou chamar um barbeiro ao palácio. Com ar ameaçador, Midas conduziu o homem a uma sala sem janelas e fechou a porta com chave. Quando tirou o turbante e deixou as longas e peludas orelhas à mostra, o barbeiro ficou muito surpreso com o que viu, mas Midas avisou-o que aquilo era segredo e o ameaçou caso contasse para alguém. O barbeiro então começou a trabalhar com suas tesouras como se nada notasse de diferente.
Porém, pouco a pouco aquele segredo começou a pesar tanto para o pobre barbeiro que ele acabou ficando mais infeliz do que o rei orelhudo. Precisava contar aquilo para alguém, dividir aquele peso insuportável, aliviar sua mente, mas temia ainda as ameaças do rei. Continuou a sofrer até que um dia teve uma inspiração. Afastou-se o máximo que pôde da cidade e, lá longe, na curva deserta de um rio, cavou um buraco na margem, ajoelhou-se na areia úmida e sussurrou dentro do buraco três vezes: "O rei Midas tem orelhas de burro".
Aliviado, repôs a terra cuidadosamente, cobrindo assim as perigosas palavras que tinha proferido e retornou em silêncio para casa. Mas bem ali, naquele ponto onde cavou o buraco, algum tempo depois nasceu uma planta que, na primavera seguinte, quando o vento agitava suas hastes flexíveis, estas faziam um barulho que parecia reproduzir o segredo que tinha sido confiado à terra: "Midas tem orelhas de burro". O vento espalhou aquele segredo por todo o reino. Logo, ouvia-se falar até na cidade e depois de algumas horas, todo mundo falava sobre as orelhas do rei e davam muitas risadas sobre o caso. O pobre Midas caiu no ridículo e passou a viver para sempre trancado em seu palácio, lamentando, mais uma vez, não ter tido prudência e bom senso. Mas já era tarde.
#GERMANO
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